segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Canto

Aquele inverno durara mais que o comum. Ele não sabia que uma friagem poderia demorar tanto a passar. O lobo começava a pensar que talvez aquela neve fosse para sempre, que aquela nuvem que cobria o seu antigo sol ficasse ali por um bom tempo. Talvez para sempre.

Já faz tempo desde que aquele tempo se foi. Não sei, parece que partes de mim contam de maneira diferente. Coração e cérebro talvez. Razão e emoção. Hoje me dei conta de que precisava escrever aqui novamente... Não que isso ajude em alguma coisa mas pode me ajudar no futuro e faço isso por puro respeito a mim mesmo. Andei ultimamente revendo antigas postagens daqui, esperando que algum avanço fosse feito mas fiz menos do que esperava. Talvez estou me pegando em um momento de fraqueza. Tinha esquecido o quão era difícil sobreviver e não conviver.

Ele tinha esquecido de como era ser um lobo solitário. "Uma vez lobo solitário, sempre solitário". Talvez aquele tempo em que o sol o iluminava fosse uma fração de segundo. Sentia-se como se fosse uma fração de segundo. Olhando para trás, ele viu que não durou muito tempo, mas que fora intenso. Em uma longa caminhada ele se encontrava. Em uma longa jornada que parecia nunca ter fim. O objetivo agora não era mais andar e andar; era esperar enquanto andava, atingir algum ponto importante, nem que desse a volta...

É como se fosse um loop. Uma hora bem, outra hora mal. Não sei quando isso acaba, se é que acaba. Até lá, sobrevivo. Diversas horas eu me sinto como se fosse invisível para os outros. A gente tenta chegar perto, tenta se interessar mas porque nada parece ter um retorno? Seria impaciência depois desse tempo todo? Depois de esperar tanto a paciência da esperança se esgota?

Ele caiu. Uma vala do tamanho de um lago. Algo que não parecia ter fundo. Era escuro, um toque de ocre nas paredes refletia seu focinho torto. Era tóxico, era mal. O lobo não deveria estar ali mas agora não tinha volta. Uma hora ia atingir o chão. E quando atingiu o chão, acordava. Sonolento, caminhou.

É quando a gente percebe que cresce. Quando você começa a fumar, quando começa a beber, quando contas de água e de luz são seus presentes no dia do seu aniversário. Não, não estou reclamando disso. É bom ter responsabilidade. Mas quando a gente é acostumado a viver em um mundo aonde somos lembrados e aonde temos gente que queira passar o resto da vida conosco. As vezes me sinto invisível, de verdade. Não é brincadeira; eu não sei explicar direito. Parece que por mais que a gente tente fazer nossa voz ser audível, ninguém parece perceber. Ninguém parece se importar com o que a gente pensa, com que a gente sente, com o que a gente ama. E esse "ninguém" é "aquela" pessoa. Porque quando a gente se importa com ela, ela se transforma em todos. tudo se remete, tudo lembra, tudo se admira e tudo se torna melancólico quando a realidade vem a tona.

O lobo caminhou e caminhou. Uma hora, acabou por encontrar uma matilha. Ele sorriu, sabia que talvez ali se entrosava com alguém. Mas caminhou por entre eles como um qualquer. Eles andavam ocupados demais uivando para a lua, comemorando o sol que tinha se apagado e que a lua era sua diva, a musa delas e deles. O que havia de errado com o sol? Porque não uivavam para ele? Ele sentiu-se diferente, invisível, pouco importante. Não havia nada para fazer ali... Além de caminhar, continuar.

É como se eu estivesse sendo diferente deles. De todo mundo. Parece que nada que eu goste ninguém parece gostar também. Sentir-se sozinho é assim? Sentir-se solitário no meio de tanta gente? Enquanto andam preocupados com a promoção, com a hora, com o ônibus, porque eu me preocupo com a lua, com a chuva esperando que ela não esteja tão gelada, com um sorriso? Eu deveria me preocupar com essas coisas também... Com conta, com pagamento, com horário. Não quero ser assim.

E assim continuou, até um dia talvez não aguentar. Ele já estava perdendo as esperanças. Sentia-se traído pelo antigo sol. Aquele que o aquecia naquele inverno; a pelagem do lobo, sua proteção, não era feita para o frio, para a solidão. Mas também, sentia-se um lobo diferente, não como aqueles. A neve que afundava por entre os dedos já era comum... O frio já era concebível... E a nuvem acima de sua cabeça tampando seu sol era sua mais nova paisagem.

Era caminhar e esperar. Queria aquele sonho... Aquele quente e confortável.